O Direito brasileiro vêm sofrendo transformações consideráveis acerca do regramento jurídico de regularização fundiária. Nos últimos tempos, o assunto tem se tornado de extrema relevância, seja do ponto de vista do direito individual ou direito coletivo, sendo o principal mecanismo de efetivação de garantias dos direitos de propriedade, função social da terra e também do Direito Ambiental de onde jamais poderá ser dissociada.
A Lei nº 11.952/2009 que dispõe sobre a regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União, no âmbito da Amazônia Legal; (Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Maranhão, Mato Grosso, Rondônia, Roraima e Tocantins), em seu artigo15º, nos casos de regularização rural, determina que o título de domínio ou termo de concessão de direito real de uso deverão conter, entre outras, cláusulas que determinem, pelo prazo de dez anos, sob condição resolutiva, além da inalienabilidade do imóvel: i) a manutenção da destinação agrária, por meio de prática de cultura efetiva; ii) o respeito à legislação
ambiental, em especial quando ao cumprimento do dispositivo no Capítulo VI da Lei nº 12.651/2012 (Código Ambiental); iii) a não exploração de mão de obra em condição análoga à de escravo; e iv) as condições e a forma de pagamento.
No Direito Civil (art. 121), a condição resolutiva é uma condição estabelecida no contrato cuja ocorrência tem o poder de tornar ineficaz o prosseguimento do negócio. A conclusão do negócio fica condicionada, subordinada a determinada situação futura e incerta e, caso tal situação se apresente, o negócio jurídico se resolve, perde sua eficácia.
No campo das regularizações fundiárias, os títulos ou termos outorgados pertenceram ao beneficiário, que exercerá os direitos de propriedade com seus efeitos. Todavia, caso não cumpra qualquer das condições resolutivas imposta, o negócio se resolverá, ou seja, será desfeito, tornando sem efeito o título ou termo já cedido.
Há de se destacar, há expressa previsão da necessidade de averbação da certidão de liberação de condições resolutivas dos títulos de domínios resolúveis emitidos pelos órgãos fundiários federais na Amazônia Legal (item 31, do artigo 167, II, da Lei nº 6.015/73); como também há previsão em vários outros textos, como no Decreto 10.592/2020, em seu artigo 44: “a certidão de liberação das condições resolutivas, de caráter declaratório, será averbada à margem da matrícula do imóvel previamente à alienação do bem pelo beneficiário do título de domínio ou do título de concessão de direito real de uso”.

A grande dificuldade encontrada na prática é a comprovação e a liberação das referidas cláusulas/condições resolutivas, que deveriam ser um procedimento administrativo de natureza simples e objetiva. Porém, percebeu-se que os órgãos fundiários (INCRA) dificultam ao extremo as referidas liberações, exigindo dos beneficiários enorme burocracia, chegando à conclusão de que era mais simples regularizar um imóvel rural (obter novo título) de que se obter as certidões de liberatórios, mesmo o beneficiário tendo cumprido todas as condições, após longo tempo.
Por sorte, o legislador trouxe uma solução parcial ao tema, aprovando a Lei nº 14/757/2023, incluindo dois artigos na Lei nº 11.952/2009 (art. 15-A e 16-A). Parcial em razão da contemplação dos títulos emitidos até 25 de junho de 2009, ou seja, os emitidos posteriores permanecem com a obrigatoriedade de liberação pela via administrativa (INCRA) sujeitos a velha e conhecida burocracia do órgão fundiário.
De qualquer forma, houve avanço, pois a partir de agora trata-se de requisitos objetivos, que, nos termos do art.16-A da Lei nº 11.952/2009, exigir-se-á apenas a comprovação de pagamento do título, observação do limite do imóvel (não superior a 15 módulos fiscais), comprovação de inscrição do imóvel no Cadastro Ambiental Rural e comprovação de não haver a ocorrência de exploração de mão de obra em condição análoga à de escravo na área a ser regularizada.
Na prática, o novo regramento jurídico alterou toda a sistemática de liberação ou não de cláusulas/condições resolutivas, de forma rápida e objetiva, por meio de uma análise vinculante com a participação de outros agentes públicos, como os oficiais de imóveis.
Portanto, as mudanças ainda serão colocadas a prova no dia a dia, esperando se que milhares de beneficiários de títulos ou termos outorgados possam enfim liberar seus imóveis das temidas cláusulas/condições resolutivas, encerrando assim um entrave importante nas regularizações fundiárias, sobretudo na âmbito da Amazônia Legal.
Autor: João Felipe Saurin, Advogado, formado em direito pela União das Escolas
Superiores de Rondônia – UNIRON e especialista em Advocacia Cível pela
Faculdade de Direito da Fundação Escola Superior do Ministério Público – FMP.